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Acórdão
Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Acórdão. Eventuais imagens serão suprimidas.
Trata-se de recurso de embargos de declaração devolvido pelo E. Superior Tribunal de Justiça, para que fossem analisados os temas referentes a matérias de ordem pública arguidas e não apreciadas em sede de aclaratórios. Em síntese, em sede de embargos de declaração, o ora recorrente apontou a ocorrência de: a. omissão, porquanto o acórdão proferido em sede de apelação cível não teria analisado a ilegitimidade passiva do serventuário para participar da demanda; b. asseverou que não seria o titular do serviço de registro de imóveis na data dos fatos, o que impediria a sua continuidade no polo passivo da demanda; c. o notário não teria recebido acervo patrimonial do seu antecessor, não havendo qualquer responsabilidade; d. de outro lado, questiona a existência de interesse de agir, referente a parcela das escrituras questionadas, por não dizerem respeito aos recorridos; e. a escritura que trata de interesse dos embargados não ocasionou qualquer prejuízo para as partes, por dizer respeito a promessa de compra e venda nunca concretizada.Em apreciação ao recurso, este E. Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por meio de sua 12ª Câmara Cível, entendeu por, originariamente, por rejeitar os embargos. Após a interposição de recurso de recurso especial, sobreveio decisão do Superior Tribunal de Justiça, dando parcial provimento ao recurso, determinando o retorno dos autos a primeiro grau. A decisão do Col. Superior Tribunal de Justiça se encontra assim indicada (mov. 1.7, 0046947-06.2014.8.16.0001 Pet): Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso especial a fim de anular o acórdão proferido em embargos de declaração (fls. 1.545/1.553), determinando o retorno dos autos ao eg. TJPR para novo exame da controvérsia, com a apreciação das matérias de ordem pública provocadas pela parte. Com o retorno dos autos a primeiro grau, a douta 1ª Vice-Presidência do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná determinou a remissão dos autos para esta relatora, para apreciar a questão.Após, os autos vieram conclusos para nova deliberação.É o que importa relatar.
FUNDAMENTAÇÃONos termos do artigo 1.022, do Código de Processo Civil: “Cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para: I - esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; II - suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento; III - corrigir erro material”.Conforme aponta Teresa Arruda Alvim WAMBIER, o recurso de embargos de declaração trata-se de recurso de fundamentação vinculada, “o que significa dizer que só podem ser interpostos nas expressas situações previstas em lei” (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Art. 1.022. IN: TUCI, José Rogério Cruz e (coord.) et. al. Código de Processo Civil: Anotado. São Paulo: AASP, 2015. p. 1.595).Dessa forma, só são cabíveis os embargos nos casos de obscuridade, contradição, omissão ou erro material. Segundo Fredie Didier Jr., neste mesmo sentido: Os casos previstos para manifestação dos embargos declaratórios são específicos, de modo que somente são admissíveis quando se apontar a existência de erro material, obscuridade, contradição ou omissão em questão (ponto controvertido) sobre a qual deveria o juiz ou o tribunal pronunciar-se necessariamente. Os embargos de declaração são, por isso, espécie de recurso de fundamentação vinculada.(DIDIER JUNIOR, Fredie. Curso de direito processual civil. Salvador: JusPodivm, 2016. Vol. 3. p. 248). No caso dos autos, o embargante sustenta a ocorrência de omissão pela ausência de manifestação quanto a pendência, por anos, de julgamento pelo Tribunal Superior do Trabalho de recurso sem efeito suspensivo. Quanto ao vício apontado, a doutrina vem pontuando como a ausência de manifestação judicial sobre ponto relevante à tomada de decisões. Neste sentido: O vício da omissão sucede quando o órgão judiciário se abstém de apreciar as questões de fato e as questões de direito, suscitadas ou não pelas partes – há as que comportam exame ex officio –, debatidas ou não, embora haja necessidade desse contraditório para legitimar o resultado obtido, desde que se configure pertinência com os elementos do processo.(ASSIS, A. Manual dos recursos. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2021. E-book). Com efeito, verifico que o Superior Tribunal de Justiça devolveu estes autos recursais para análise específica de dois temas, relativos a matérias de ordem pública, a saber: a ilegitimidade passiva do serventuário e a falta de interesse de agir.Entendo que a ilegitimidade passiva arguida deverá ser conhecida e acolhida.A legitimidade diz respeito à pertinência subjetiva para que um determinado sujeito de direito venha a figurar dentro da relação jurídica processual. Neste sentido, destaco: Assim, a legitimidade das partes corresponde à pertinência subjetiva da lide. Desse modo, ao verificá-la, o juiz deverá examinar se os sujeitos que figuram como autor e réu, em um dado processo, são aqueles que, considerando os fatos narrados na petição inicial, deveriam realmente figurar como autor e réu.(PINHO, H.D.B. Manual de Direito Processual Civil Contemporâneo. São Paulo: SaraivaJur, 2023. E-book). No caso dos autos, porém, persiste a discussão acerca da possibilidade de responsabilizar o serventuário pelos atos praticados por seu antecessor na serventia. Com efeito, verifica-se que os fatos foram praticados pelo titular anterior da serventia extrajudicial, e não pelo embargante.Compulsando-se os autos, é possível verificar que o ora embargante apenas assumiu a titularidade do 8º Ofício de Notas de Curitiba em 05 de dezembro de 1990, e as escrituras públicas teriam sido firmadas em 14 e abril de 1975.Dito de outro modo, os atos não foram lavrados pelo embargante, mas por um de seus antecessores dentro da mesma serventia extrajudicial.Nos termos da Súmula nº 64, deste E. Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, a legitimidade para responder por atos praticados no âmbito da prestação de serviços notariais é da pessoa natural, ou seja, do titular, sendo que a serventia não dispõe de personalidade jurídica para tanto. Neste sentido: Nas ações de indenização em decorrência de atos praticados pela prestação de serviços notariais e de registro, as serventias extrajudiciais não possuem legitimidade passiva "ad causam", mas responderão os titulares, inclusive por atos de seus prepostos, assegurando-se o direito de regresso no caso de dolo ou culpa, nos termos do art. 22 da Lei nº 8.935/94. Trata-se de um sistema lastreado na responsabilização pessoal do titular da serventia, permitindo, no entanto, que haja ação de ação de regresso em face dos prepostos.Pois bem. Em interessante precedente, a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça analisou a legitimidade dos titulares de serventias extrajudiciais em caso de sucessão, ou seja, quando há uma substituição de um serventuário por outro. Neste sentido: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 3 DO STJ. SERVENTIA EXTRAJUDICIAL. AUXILIAR/ESCREVENTE. LICENÇAS-PRÊMIO NÃO GOZADAS. CONVERSÃO EM PECÚNIA. DELEGAÇÃO DE SERVIÇO NOTARIAL OU REGISTRAL. OBRIGAÇÃO DO NOVO TABELIÃO DE SATISFAZER AS OBRIGAÇÕES TRABALHISTAS DO ANTIGO TITULAR. INEXISTÊNCIA. AUSÊNCIA DE SUCESSÃO. ACÓRDÃO RECORRIDO CONSONANTE COM A ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL DO STJ. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 83. AGRAVO INTERNO DO PARTICULAR DESPROVIDO.1. Na hipótese em apreço, o acórdão impugnado manteve a sentença que julgou improcedente a pretensão do autor, ora agravante, ao fundamento de que o novo titular dos serviços notariais recebe a delegação de forma originária, não havendo relação sucessória entre os titulares da serventia, o que afasta a responsabilidade do posterior delegatário, no que se refere às obrigações anteriores, assumidas por outro titular.2. Nota-se, assim, que o aresto combatido guarda consonância com o entendimento jurisprudencial do STJ, no sentido de que a delegação para o serviço notarial e de registro é feita de forma originária", não herdando o novo titular eventuais passivos (trabalhista, fiscal ou cível). Esta Corte Superior de Justiça já se manifestou, em diferentes oportunidades, no sentido de que os serviços notariais e de registro não possuem personalidade jurídica, considerando-se legitimado para responder pelos danos causados por ato seu ou dos seus prepostos, o titular da serventia à época dos fatos. (REsp 1340805/PE, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/06/2019, DJe 10/06/2019).3. Inarredável, portanto, a incidência da Súmula 83/TJ.4. Agravo interno do particular desprovido.(Superior Tribunal de Justiça. Primeira Turma. AgInt no AREsp 152479/SP. Rel. Des. Conv. Manoel Erhardt. Julgado em 30 de maio de 2022). Este E. Tribunal de Justiça do Estado do Paraná não diverge, aplicando entendimento similar quando da análise da questão: EMENTA – DIREITO CIVIL E PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE “RESTAURAÇÃO” (LAVRATURA) DE ASSENTO DE NASCIMENTO. INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. REGISTRO NÃO ASSENTADO DO RESPECTIVO LIVRO DA SERVENTIA RESPONSÁVEL. ILEGITIMIDADE PASSIVA DA SERVENTIA (CARTÓRIO). AUSÊNCIA DE PERSONALIDADE JURÍDICA. JURISPRUDÊNCIA STJ. RESPONSABILIDADE DO OFICIAL DE REGISTRO À ÉPOCA DOS FATOS. EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO RELATIVAMENTE AO PEDIDO DE INDENIZAÇÃO. RECURSO PREJUDICADO.1. Consoante entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, e com fulcro nas determinações do art. 22 da Lei nº 8.936/94, em razão dos serviços notariais e registrais não serem dotados de personalidade jurídica, responsabilizam-se os notários e oficiais de registro por danos causados por eles ou demais serventuários.2. Tendo a parte autora ajuizado ação buscando indenização por danos morais em virtude de erro cometido pelo Oficial do Cartório de Registro de Pessoas Naturais da Comarca de Icaraíma, contudo veiculando o pleito em face da própria serventia, verifica-se a ilegitimidade da requerida para figurar no polo passivo da demanda, dado que sequer possui personalidade jurídica para tanto, sendo aquele de fato responsável pelos prejuízos causados o Sr. Oficial à época dos fatos.3. Tratando-se a ilegitimidade de matéria cognoscível de ofício a qualquer tempo e grau de jurisdição, nos termos do § 3º, art. 485 do Código de Processo Civil, impõem-se a extinção do feito sem resolução de mérito, restando prejudicado o conhecimento do recurso de apelação interposto pela autora.4. Apelação Cível que se julga prejudicada, extinguindo-se o feito sem resolução de mérito, relativamente à pretensão indenizatória, responsabilizando a autora pela sucumbência (art. 85, §2º/CPC).(Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. 17ª Câmara Cível. AC 0000483-95.2021.8.16.0091. Rel. Des. Francisco Carlos Jorge. Julgado em 28 de março de 2022). Ora, reconhecida a possibilidade de responsabilizar o sucessor por atos praticados pelo sucedido na serventia extrajudicial seria qualquer coisa semelhante a afastar a responsabilidade pessoal, aplicando como se responsabilidade institucional fosse.Dito isto, entendo que, de fato, o ora embargante padece de legitimidade passiva ad causam para figurar no polo subjetivo da demanda, a qual deveria ter sido intentada contra o titular à época dos fatos.Pelo exposto, voto por conhecer e acolher os embargos, conferindo-lhes efeitos infringentes, para fins de reconhecer a ilegitimidade passiva do embargante. Tendo sido acolhida a tese da ilegitimidade passiva, fica prejudicada a análise da ausência de interesse de agir.Considerando que o acolhimento dos embargos implicará extinção parcial do feito em relação ao recorrente, entendo por condenar os autores ao pagamento de custas referentes e honorários advocatícios de sucumbência ao patrono do embargante.Uma vez que a extinção parcial do feito pela ilegitimidade não implicará no encerramento do processo, e que tal instituto não possui expressão econômica apreciável – que poderia engendrar algo semelhante a proveito econômico e valor da causa – entendo ser caso de fixar honorários advocatícios com base no art. 85, §8º, do Código de Processo Civil, ou seja, com base na equidade.Dito isto, reconhecendo a simplicidade do tema, voto por arbitrar honorários de R$ 500,00 (quinhentos reais), os quais compreendo suficientes para remunerar condignamente o patrono da parte.É como voto.
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